Curitiba e o Rio sofrem com o problema sério da evasão de passagem, o que influencia na tarifa
Na nossa terceira reportagem da série O Sul em 12 dias, hoje vamos mostrar os problemas que nossa capital, Rio de Janeiro, e Curitiba têm em comum e algumas soluções de Curitiba que poderiam ser replicadas aqui. Num primeiro momento, Curitiba pode parecer um exemplo de cidade, mas, como toda a cidade grande que se preze, tem seus problemas de ordem pública, principalmente relacionadas aos transportes. Listaremos algumas delas:
1) Os caloteiros. Ou melhor, os fura-catracas:
O primeiro problema que impacta os transportes curitibanos é a questão do não pagamento da passagem pelos caloteiros, ou como são chamados, fura-catracas. Em uma pesquisa feita pelo Sindicato das Empresas de Ônibus de Curitiba e Região Metropolitana (Setransp-PR) em Novembro do ano passado mostra que 3.317 pessoas não pagaram a passagem nas estações-tubo da cidade, por dia. Comparado com a pesquisa feita em Agosto, houve uma redução de 10%, enquanto que, se comparado com Novembro de 2018, a redução foi de 18%.
Em Junho de 2019 foi lançado a Operação Fura Catraca, uma iniciativa das empresas de ônibus que visa combater o não pagamento da passagem, que é considerado crime. Os agentes percorrem as estações-tubo para fazer a conscientização e, caso seja flagrado algum calote sendo dado, encaminha o usuário que não pagou a passagem para os órgãos de segurança pública, como a Guarda Municipal e a Polícia Militar (PM). Em 5 meses de operação houve uma redução de 17% nas estações atendidas pela operação, enquanto que, em 1 ano, a redução é de 31%.
Em Novembro/2019, a estação mais invadida foi a estação Fanny, no sentido Pinheirinho, seguido pela mesma estação Fanny, só que no sentido Praça Carlos Gomes e pela Estação China (bi-direcional). O prejuízo estimado chega à R$ 5,5 milhões por ano. Veja a lista:
Posição | Estação |
1 | Fanny (sentido Pinheirinho) |
2 | Fanny (sentido Carlos Gomes) |
3 | China (bi-direcional) |
4 | Rio Barigui (sentido Centro) |
5 | Morretes (sentido Bairro) |
6 | Rui Barbosa (sentido Terminal Centenário) |
7 | Rio Barigui (sentido Bairro) |
8 | Praça Carlos Gomes |
9 | Presidente Kennedy (bi-direcional) |
10 | São Pedro (sentido Carlos Gomes) |
Enquanto isso no Rio, lidamos com o problema da falta de pagamento de passagem praticamente desde a implantação do nosso sistema de BRT, iniciado pelo TransOeste em 2012. Com a abertura do ramal Campo Grande do corredor, foi-se constatando o aumento exponencial de pessoas que não pagava passagem principalmente no trecho da Avenida Cesário de Melo, que margeia várias favelas, dominadas pela milícia ou pelos traficantes. Por conta do alto número de caloteiros, a linha 17 (Campo Grande x Santa Cruz) ganhou o apelido, nada carinhoso, de “Trans-Crack”, pois segundo os passageiros, era comum usuários de drogas invadirem os ônibus para fumar drogas ilícitas e buscar elas nas favelas da região.
Segundo dados do BRT Rio, empresa que administra todo o sistema de ônibus rápidos, cerca de 74.000 passageiros dão calote nas estações dos três corredores (TransOeste, TransCarioca e TransOlímpica) por dia, gerando um prejuízo estimado de R$ 5 milhões ao mês. Com esse dinheiro, poderia ser adquirido 5 novos articulados para o corredor.
Em 2019, o BRT Rio, em parceria com a guarda municipal, iniciou a verificação dos cartões Rio Card para ver se o passageiro passou ou não pela roleta, à exemplo do que acontece no VLT. O passageiro flagrado terá que pagar uma multa de R$ 170,00, tendo um acréscimo de 50% (R$ 255) se for reincidente. Mas segundo relatos de passageiros, essa fiscalização parece não ser tão eficiente assim, pois os relatos de passageiros dando calote continuam.
Uma das soluções que Rio e Curitiba encontraram foi a colocação de anteparos nas estações. Em Curitiba, a primeira estação à receber foi a do Passeio Público, no sentido Santa Cândida, enquanto que no Rio foi a estação do Mato Alto. Na estação Passeio Público de Curitiba, a redução foi de 102% em 1 ano (de 1.462 calotes para 260 ao dia), enquanto que não há dados oficiais sobre a redução na Estação Mato Alto.
2) Pessoas andando nas canaletas do BRT:
O segundo item da nossa lista é uma questão mais de ordem social e conscientização do que econômica. Circulando pelas canaletas da área central, principalmente naquelas com pouco movimento, você vê muitas pessoas circulando pela pista exclusiva como se nada acontecesse. Cena que, infelizmente, é comum tanto lá quanto aqui. Nesta foto registrada por nós, você vê as pessoas andando de bicicleta tranquilamente na Rua Visconde de Guarapuava, como se nada tivesse acontecendo.
Enquanto que no Rio, não é muito incomum você ver carros ou pedestres trafegando indevidamente no corredor, o que já ocasionou muitos acidentes, inclusive, alguns fatais. As pessoas precisam se conscientizar que, ao contrário de um ônibus convencional, um ônibus articulado e/ou bi-articulado demora mais pra frear. E caso acerte algum carro ou pedestre, o impacto pode ser forte, ou até fatal.
3) A falta de uma frota mais moderna e ônibus com maior capacidade:
Para Curitiba é mais um ponto a favor, enquanto que pro Rio é mais um problema.
É consenso que Curitiba esbanja modernidade em sua frota. Durante este mês de Abril, mais 104 ônibus foram entregues à população curitibana, totalizando 514 ônibus entregues desde o início da gestão do prefeito Rafael Greca (PMN), em 2017. Destes 104, 30 são articulados, 6 bi-articulados e 20 do tipo “padron” (com motorização traseira), o que corresponde no total de 51% da nova frota.
Enquanto isso, na cidade do Rio, em 2020, apenas 3 empresas estão recebendo ônibus novos: Novacap (11 ônibus), Graças e Verdun (10 ônibus cada). Mesmo os ônibus tendo ar-condicionado, item obrigatório desde 2014 cujo processo de climatização total se arrasta desde então, as empresas optam em adquirir ônibus com a motorização frontal (ou como são conhecidos: os ônibus cabritos). Numa cidade “séria”, os ônibus cabritos estariam somente restritos às linhas ‘alimentadoras’, deixando as linhas troncais e diametrais sendo operadas com ônibus de motorização traseira e/ou articulados.
Como mostramos na matéria anterior, desde 2018, Curitiba está se adaptando à uma “nova realidade” e implementando ligeirinhos com portas dos dois lados, para otimizar a operação, não deixando a operação restrita somente para atender às estações tubo.
Quando o Rio decidiu implantar os sistemas de BRT, acreditava-se que o sistema fosse vingar do jeito que o ex-prefeito Eduardo Paes imaginava que fosse. À medida que os trechos foram sendo abertos, muitas linhas foram sendo extintas e/ou encurtadas, sobrecarregando as linhas do BRT. O resultado 8 anos depois? Uma redução de quase 100 articulados do sistema, com o consequente sucateamento, principalmente no eixo da TransOeste, onde o asfalto acaba colaborando com a detonação dos ônibus.
Superlotação é um problema comum em todas as cidades brasileiras, mas o Rio de Janeiro acredita que pondo 40-50 ônibus de tamanho normal (padrão M. Benz OF-1721 E5, 12 metros) vai solucionar o problema, porém, só iremos resolver este e outros problemas de mobilidade se houver uma gestão pública eficiente, com um subsídio ao nosso bilhete único que realmente valha a pena para as empresas. O ex-prefeito Eduardo Paes, à época da implantação do Bilhete Único Carioca, optou em reduzir o ISS das empresas para 0,00001%, como uma forma de subsidiar, acreditando-se que a cidade sobreviveria com uma passagem sendo repartida igualmente para duas empresas. A conta começou a chegar em 2015, e o resultado 10 anos depois é: de 46 empresas no início da era dos consórcios, 15 fecharam as portas. E ainda há o risco de mais duas, estando direta ou indiretamente relacionadas à falta de subsídio, fecharem as portas: Vila Isabel e Acari. Será que esta crise do Coronavírus servirá de lição para alguma coisa? Só o tempo dirá…
Com isso, nossa viagem por Curitiba acaba por aqui. Na próxima reportagem da série, vamos conhecer as opções rodoviárias entr e Curitiba e, nosso próximo destino, Florianópolis.
Com informações da URBS – Curitiba, Setransp-PR, O Globo, Extra e O Dia