Opinião: o transporte público lotado merece ser tão recriminado quanto praias e bares lotados.
Opinião: o transporte público lotado merece ser tão recriminado quanto praias e bares lotados.

Opinião: o transporte público lotado merece ser tão recriminado quanto praias e bares lotados.

Por Gabriel Petersen Gomes

Linha 483 (Penha x Ipanema/General Osório – via Expressa) hoje (20/09), sentido Ipanema, 15:30. Poderia ser a foto de antes da pandemia, mas não é. A foto que estampa esta matéria foi tirada hoje, num domingo em que não fez sol (ou seja: ninguém estava na foto indo pra praia), onde a maioria ali estava apenas indo para casa, seja saindo do trabalho ou da casa de algum parente. Infelizmente, essa cena continua sendo muito comum em tempos de pandemia, onde um dos protocolos sanitários que foram impostos é o do distanciamento social. O transporte público, principalmente quando ele está lotado, é um dos principais (se não o principal) vetores de transmissão da Covid-19.

Essa imagem deveria chocar, mas não. As pessoas fecham os olhos pra isso, com a desculpa de que eles estão ali porque são obrigados a trabalhar, mas no final de semana, ficam esbravejando que tem que ficar em casa porque está numa pandemia e não pode “se aglomerar” (diga-se de passagem, já tá cansativo falar em aglomeração). Não interessa se é no ônibus, no bar, na praia. Aglomeração é aglomeração e precisa ser recriminada de maneira igual! O prefeito aumentou a multa pra bar e restaurante que provocar aglomeração de R$ 1.500 para R$ 15.000, com a reincidência chegando à R$ 27.000. E a multa pros ônibus lotados? Não aumenta porque? Detalhe: as multas dos ônibus, muitas vezes, nem sequer são pagas!

O BRT é um dos que mais sofrem com a superlotação em tempos de pandemia. Mesmo a empresa alegando operar com 100% da frota, mas 50% da demanda, a realidade é bem diferente. Foto: Gabriel Petersen Gomes / Arquivo

As empresas de ônibus do Rio, ao invés de colocarem mais ônibus nas ruas pra, assim, reduzir a superlotação, estão simplesmente reduzindo a frota e demitindo rodoviários, o que está elevando a taxa de desemprego e batendo a marca de 14% da população brasileira. Só na última semana que passou, cerca de 300 rodoviários de 3 empresas foram demitidos e a tendência é que piore cada vez mais.

O prefeito Marcelo Crivella, ao invés de tomar ações enérgicas pra melhorar a frota, manda as empresas colocarem pegadas no chão dizendo que tem que ficar 2 pessoas por m² em pé, sendo que para o Rio de Janeiro, isso é humanamente impossível. E fica dando margem pra van rodar pela cidade toda fazendo trajeto de ônibus que some e fica por isso mesmo.

Enquanto o Rio de Janeiro fica patinando entre 55% e 60% da frota na rua, São Paulo, por exemplo, tem 85% da frota na rua. E a crise que já se arrasta desde 2015 não tem como principal ponto chave a questão da tarifa, que, ao contrário do que a Rio Ônibus afirma, NÃO é a mais barata do Brasil. A verdade é que o sistema de transporte público da cidade do Rio de Janeiro precisa ser todo refeito do 0, de uma maneira que atenda a todas as partes envolvidas: passageiro, empresas, rodoviários e Poder público.

O transporte público em São Paulo, graças a sua organização e, principalmente, aos subsídios recebidos, está conseguindo passar sem grandes problemas, mesmo com lotação sendo registradas muitas das vezes.

No mês em que a novela da climatização da frota municipal deveria chegar ao fim, a verdade é que ela não vai chegar, porque simplesmente as empresas não vão mais renovar enquanto não tiverem o que querem (a tarifa mais cara e o subsídio do governo federal). Sabem o BRT TransBrasil, que já se arrasta há 6 anos? Ele vai ser aberto, mas não vai ter BRT rodando porque as empresas não encomendaram ônibus! Um ônibus demora de 3 a 4 meses pra ficar pronto. À essa altura do campeonato, já era pras empresas já terem ido às compras.

Em resumo:

  • Não pode praia lotada, mas pode o transporte público lotado
  • Não pode bar lotado, mas pode colocar 20.000 pessoas dentro do estádio no jogo do Flamengo
  • Bar e restaurante levam R$ 15.000 de multa por aglomeração, mas ônibus leva bem menos do que isso. E ainda recorre pra não pagar!

Antes de você criticar as praias, os bares e restaurantes lotados, cobre do poder público medidas pra garantir a segurança sanitária nos transportes públicos, principalmente no ônibus.

E só mais uma coisa: a pandemia pode não ter acabado, mas não existe mais quarentena, agora não passa de falácia do poder público pra poder roubar ainda mais. Não quiseram flexibilizar? Flexibilizaram à la Bangu, agora que o prefeito aguente as consequências. A culpa não é só da população que não usa a máscara ou então usa ela errada. A culpa também é das três esferas de governo, principalmente o federal e o seu negacionismo escancarado. Nas próximas eleições municipais, pensem bem na hora de votar. Pois dependendo da escolha, o transporte público no Rio estará fadado à ruínas.

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